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quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Terra sem Males.

ÍNDIOS GUARANI MBYÁ: LOCALIZAÇÃO GEOGRÁFICA, POPULAÇÃO, MIGRAÇÃO, TRADIÇÃO
Pensar a história e a cultura brasileira implica, antes de tudo, refletir sobre os índios que aqui viveram e ainda vivem – ou melhor, sobrevivem. Segundo a Fundação Nacional do Índio, Funai, existem cerca de 460 mil índios vivendo em aldeias no Brasil, correspondendo a 0,25% da população brasileira. Entre os povos indígenas presentes no Brasil, os Guarani são estimados em 34 mil, subdivididos entre os Kaiowá (18 mil a 20 mil), Nhandéva (8 mil a 10 mil) e Mbyá (5 mil a 6 mil), de acordo com o site Povos Indígenas no Brasil. Atualmente, os Guarani podem ser encontrados vivendo entre o Espírito Santo e o Rio Grande do Sul.

Contudo, há certa dificuldade de se contabilizar a população Mbyá devido à característica migratória desse grupo, pois os descendentes dos povos - que viviam na província do Guaíra, onde hoje se situa o Estado do Paraná – estão atualmente presentes em grande parte do território brasileiro. Para o lingüista Aryon Dall’Igna Rodrigues entre os idiomas da família Tupi-Guarani o Mbyá é o mais distribuído geograficamente, estando presente nos Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo, além de também ser encontrado no Paraguai e na Argentina. O doutor em antropologia Aldo Litaiff afirma que “a vida do Mbyá é a história de suas viagens pelas aldeias onde moraram, e onde estão seus parentes. A cronologia desses Guarani é marcada pelos períodos de perambulação nas estradas, em contraposição às paradas nas aldeias”.

Entre os índios Guarani, os Mbyá são considerados pelos estudiosos como os que mais preservam sua tradição, devido principalmente pelo fato desse grupo indígena ter se estabelecido em território que durante muito tempo foi inacessível aos colonizadores ibéricos e aos missionários jesuítas durante o início do século XVII. Dessa forma, tornaram-se conhecidos como “caaiguás” ou “cainguás”, ou seja, “índios da floresta”. A antropóloga Hélène Clastres afirma que “caaiguás que se mantiveram isolados no período colonial podem ser o grupo de onde se acredita que descendem os Mbyás".

Provavelmente devido a essa história, os Mbyá, dentre os grupos indígenas Guarani, sejam os que melhor preservaram sua identidade cultural: “os mbiás são inegavelmente os que afirmam e tentam com o máximo rigor preservar sua identidade cultural”, afirma Hélène Clastres. Para esse grupo a religião e a língua são as principais formas de preservar sua identidade cultural, sendo a língua, conforme afirma Hélène Clastres, “o veículo pelo qual podem ainda firmar sua diferença, e isso explica que seja mantida secreta e ocupe um lugar privilegiado na vida cotidiana”. As crianças pequenas e as mulheres, principalmente as mais idosas, são monolíngües, ou seja, falam apenas o Mbyá.

A religiosidade Guarani passa, sobretudo, pela procura da Terra sem Males, paraíso que os índios acreditam existir na Terra, onde seria possível chegar a ela ainda em vida, sem passar pela morte. Hélène Clastres afirma que os Guarani atribuem a esse lugar uma localização geográfica específica, sendo às vezes considerada a leste e outras a oeste. “Todo o pensamento e a prática religiosos dos índios gravitam em torno da Terra sem Mal”, enfatiza Hélène Clastres, sendo que os Mbyá é o que consideram mais significativo o mito do Paraíso na terra.

A característica migratória dos Mbyá Guarani também diz respeito às crenças religiosas desse grupo indígena. Para Aldo Litaiff os índios Mbyá “migram em busca de terra de solo fértil e mata virgem, onde seja possível viver de acordo com as normas e valores de sua cultura, rezando e praticando os exercícios espirituais necessários para se alcançar o Paraíso”. Os índios Guarani de Santa Catarina são também fruto desses movimentos migratórios em busca da Terra sem Males.

Em Santa Catarina os Mbyá estão presentes em Ibirama, no Alto Vale do Itajaí; no litoral, no município de Palhoça, distante da capital Florianópolis 15 km; e no município de Imaruí, localizado no sul do Estado, distante 22 Km de Imbituba e 110 Km da capital do Estado. Os Mbyá Guarani presentes hoje no litoral catarinense migraram do Paraguai para o Rio Grande do Sul provavelmente durante a década de 30, fundando uma aldeia no município de Viamão. Dessa aldeia, segundo a lingüista Marci Fileti Martins, migraram para o Estado catarinense há alguns anos fundando as aldeias de Maciambu e do Morro dos Cavalos ambas situadas no município de Palhoça. Dessas aldeias, alguns índios migraram posteriormente para o município de Imaruí, fundando a aldeia Tekoa Marangatu. Atualmente, um dos maiores problemas que os povos indígenas encontram é a questão do direito à terra, o direito a um espaço onde possam preservar sua tradição em meio à natureza, tão determinante em suas vidas.

sábado, 11 de dezembro de 2010

Livro.

O segredo milenar da cura indígena através das ervas.

1. Introdução.

Um dos pesquisadores da universidade do Paraná, Edvino Donato Tempski, realizou pesquisa sobre os índios Kaingangues do Alto Uruguai. Esta pesquisa foi publicada no livro"Caingângues, gente do mato". Ele 1 vice-presidente do Instituto Histórico, Geográfico e Etnográfico Paranaense fundado em 1902, pesquisava sobre os índios Kaingangues. As tradições dos índios Kaingangues foram mais fortes na região do norte do Rio Grande do Sul. Ele que nasceu no ano 1913 em Erechim, capital do Alto Uruguai, no lugar onde hoje fica o catedral. Era enviado pela universidade para registrar e salvar o que restou desta bonita e rica cultura. O senhor Tempski era preparado para este trabalho como ninguém outro: pesquisador, historiador, médico e escritor. Como bom observador mostrava amor especial para este trabalho e fazia algumas observações e anotações desde os anos 20.

Médico profissional de destaque em Curitiba tinha facilidade entender e escrever sobre medicina natural dos índios. No ano 1984 foi escolhido Secretário Geral de X Congresso Brasileiro de médicos escritores. Atuava junto com outro pesquisador de destaque seu colega Moises Paciornik.

Em 2002, ano da campanha da fraternidade, fala sobre os índios, o que mobilizou e incentivou um grupo de pesquisadores para dar continuidade a este trabalho e escrever mais sobre as plantas medicinais dos índios Kaingangues.

Um dos pesquisadores neste trabalho é Oruã, junto com padre. Oruã é de família de Rosa, nome completo: josé Mauro oruã da Rosa. Ele no dia 19 de fevereiro de 2002 foi escolhido presidente de COCAI / Conselho Nacional de Capacitação dos Povos Indígenas/ dos Índios de todo brasil. Identidade COCAI tem como objetivo preservar as tradições indígenas no Brasil.

Escolhido pelos índios, representantes de todas as tribos do Brasil. Ele sentiu-se obrigado em consciência fazer alguma coisa, sendo a pessoa mais competente para este trabalho.

José Mauro Oruã da Rosa nasceu no dia 21 de setembro 1959, em Erechim RS, na família indígena que tinha tradição de pajelança. Seu avô era pajé e com ele aprendeu muita coisa, desde 7 anos de idade. Seu avô nasceu nos anos 1880 quando as tradições dos Kaingangues ainda foram vivas e cultivadas por todos.

Ele vivia quando ainda tinha pessoas idosas lembrando tempos onde não tinha nenhum branco /fog/ por perto. Quando tinha 12 anos seu avô faleceu. Neste tempo já tinha suas idéias sobre medicina natural e começou trabalhar o que aperndeu de seu avô. Até sente saudades do seu avô e gosta de visitar os lugares onde passava com ele, procurando plantas, ouvindo histórias e aprendendo os segredos dos seus antepassados.

Desde os 22 anos começou a ajudar as pessoas. Com a morte do seu avô, ficou no compromisso de resgatar a cultura Kaingangues. principalmente, sobre plantas medicinais, danças e pinturas. Aprendeu do seu avô 28 danças diferentes[por exemplo:dança de chuva, de guerra, de caça, de colheita, e outras] danças que foram antigamente conhecidos no meio dos Kaingangues e hoje são esquecidos. O avô dele ensinou-lhe também muito sobre as pinturas não só de Kame e Kairu, mas muito mais. Desta riquíssima cultura pouco restou e ainda é tempo de resgatar o que sobrou.

"Meu avô viveu em meio a tempo difícil, não tinha possibilidade de pesquisar nem os recursos. Naquela época os pajés até o dia de hoje virem assombrados com isto o que aconteceu no passado. Não falam que eram pajés. Até meu avô Sebastião não usava seu nome indígena deixando o só para amigos mais íntimos. Hoje posso dizer, que sou herdeiro de uma pajelança e herança do meu avô. Ele não escolheu nenhum dos seus filhos. Teve dois filhos homens e oito filhas. talvez observando a eles viu que não tinham capacidade ou não tinham interesse e eu como criança pequena e doente tinha interesse e carinho especial da parte do meu avô.
Como neto preferido transmitiu para mim muitos segredos. Não quero deixar eles só para mim mas desejo repartir com os outros. que todos poderiam conhecer um pouco mais desta cultura maravilhosa, cultura dos índios que aqui viviam há milhares de anos".

A história de Erechim, a história do Rio Grande do Sul, e do Brasíl, comparando com milhares de anos de vida nestas terras dos índios, ela é muito curta. Sendo escolhido pelos índios do Brasil como presidente do Conselho Nacional de Capacitação dos Povos Indígenas sente alegria e obrigação junto com o padre em escrever este livro e resgatar um pouco desta maravilhosa cultura, especialmente sobre medicina natural dos índios.

2. Biodiversidade.

O Brasil é o país mais rico do mundo em biodiversidade. A Amazônia, com seus 6,5 milhões de km2, é a maior floresta tropical do mundo. A maior parte da floresta encontra-se em território brasileiro.

A Mata Atlântica, ao contrário da floresta amazônica, desenvolveu-se sobre extensa cadeia montaniosa que acompanha quase todo o litoral brasileiro. A evaporação da água do mar, os ventos que sopram em direção ao continente ajudam deter a umidade necessária para a formação de uma floresta tropical. A condensação dessa água, que se resfria ao chegar às serras litorâneas, vira em chuva, muito frequentes na região.

Conforme os botânicos que a pesquisaram, a Mata Atlântica é a floresta que mostra a maior diversidade de vegetais do mundo.

Acreditamos que contém mais de 25 mil espécies de plantas, muitas delas que só existem apenas nesse ecossistema. Comparando o número total de espécies animais e vegetais que a habitam, chegaremos a cerca de 200 mil. Para comparar, na floresta temperada da Europa crescem em média dez espécies por hectare e na Mata Atlântica mais que 150 espécies em igual área.

Nossos índios tinham a maravilhosa possibilidade de experimentar tanta variedade de plantas aqui existentes. Com certeza não descobriram tudo e para nos sobrou muito e ainda sobre para desvendar. como dizem os cientistas, a maior parte da fauna e de flora ainda não foi clasificada.

Como a malária, doença que dizimava milhões de pessoas, a cura dela foi achada na planta usada pelos primitivos. Com certeza a cura de muitas doenças que preocupam hoje e amanhã ao mundo podem ser encontradas na natureza. Talvez o câncer, aids tenham sua cura na natureza.

Hoje começamos a valorizar muito mais a natureza e pesquisar. Os índios do seu jeito pesquisavam milhares de anos vivendo dia a dia no meio da natureza. Cada planta, eles experimentavam mastigando, saboreando, comendo. Observando os pássaros, animais e comportamento deles. observavam as reações do próprio organismo como reagia experimentando diversas plantas.

Dizem que mais patenteiam nossas plantas são os cientistas dos Estados Unidos porque eles possuem os maiores e melhores laboratórios. Descobrem a utilidades das plantas o que muitas vezes os índios já sabiam e sabem há milhares de anos.

Queremos neste livro falar só sobre as plantas nativas. Não são as nativas plantas que chegaram de fora, por exemplo, do clima frio e outros regiões do mundo. Elas nascem aqui, mas não possuem propriedades medicinais como lá de onde vieram. Elas são acostumadas a crescer naturalmente em outro lugar outro clima, ambiente. Perde-se muito nestas adaptações. Elas muitas vezes mudam seu princípio ativo.

Algumas plantas se desenvolvem em clima frio. As plantas que hoje usamos muitas são vindas da Europa como por exemplo: camomila, hortelã, alho e outras.

Estas plantas são conhecidas, pesquisadas e é difícil alguma coisa nova descobrir. As plantas daqui que temos são milhares e não conhecemos muitas delas, nunca foram estudadas e as únicas pistas para seu uso os índios podem nos fornecer.

As nossas plantas oferecem uma enorme quantidade de opções de princípios ativos, que podem ser utilizados na preparação de medicamentos.

Todas as formas de medicina: alopática ou homeopática, tradicional ou alternativa, em grande parte valem-se das florestas tropicais como base para a fabricação de seus medicamentos, sejam pomadas, antibióticos, chás, tinturas, anti-concepcionais ou anti-câncer. São inúmeros os remédios desenvolvidos a partir de usos nativos de plantas.

Um dia talvez vamos digitar...........

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Livro não publicado.

Índios.


Lívro que ainda não foi editado que fala como foram exterminados índios que viviam aqui milhares de anos./uma das histórias/

[região de Lapa/desde Laje até Curitiba/
Campo do Tenente, Rio Negro, Itaiópolis, Alto Paraguassu/Lucena/....


“O PACIFICADOR DE ÍNDIOS XOKLENG”
IBIRAMA - SANTA CATARINA - BRASIL
(MOSER/PEYERL).

Santa Catarina: berço dos índios Xokleng: (os primeiros donos da terra)

Vou narrar aqui, como se processou a complexa pacificação dos índios Xokleng, (Gê - Botucudos), assim apelidados por utilizarem o botoque no lábio inferior, que os diferenciava de outras tribos da região). Estes índios também chamados pelos brancos de “bugres”, já viviam aqui no Brasil há séculos, mesmo antes do “descobrimento” pelos portugueses. No estado de Santa Catarina, eles eram na época de nossa história, alguns milhares. Dominavam três quartos deste estado, (incluindo todo o planalto, de norte a sul e a leste até o vale dos rios: Itajaí Açu, Itajaí do Norte, Itajaí do Sul e Itajaí do Oeste, serras e campos de Lages, Curitibanos, e outros), além de uma pequena parte do estado do Paraná.(os índios Xokleng, pertencem ao grupo Gê ou Tapuia).
Eles dominavam todo este território porque eram andarilhos, não cultivavam a terra para sobrevivência e viviam da caça, pesca e frutos silvestres. As armas de caça e pesca dos índios eram: arcos, flechas e lanças.Por serem nômades, abrangiam glebas grandes de terras, para garantir sua sobrevivência. A melhor época para tal, era entre os meses de março e maio, (época de abundância do pinhão araucária). Esses meses eram para eles: as “vacas gordas”, porque o estado de Santa Catarina possuía, (segundo relatos históricos), na época, a maior área de pinheiro araucária do Brasil. Ao iniciar - se a colonização dos alemães em Blumenau (quando da abertura da trilha que ia do Rio Grande do Sul a São Paulo e vice-versa), os Xokleng, começaram a sentir a restrição do seu território e foram se recostando. Já na construção desta trilha, houve vários embates entre índios e trabalhadores, mas de “pouca monta”, o que resultou em apenas alguns sustos para ambos os lados.
pg.16

Tem início os primeiros conflitos

Com a trilha pronta, começavam a passar as tropas, o que facilitou bastante a entrada dos colonos, que tanto entravam oriundos do norte, como do sul e também pelo vale do Itajaí - Açu e tinham a trilha como acesso a tudo. Esses colonos foram se instalando a beira da trilha e assim, apertando os índios cada vez mais. De vez em quando, nas passadas das tropas, os índios sentindo – se acuados, faziam pequenos ataques as vezes flechando um boi, e as vezes também levando uns “grãos de chumbo” pelas costelas. Quando flechavam um boi, os tropeiros abandonavam o animal e seguiam viagem, e quando a tropa passava, tudo se acalmava e os selvagens aproveitavam o boi que tinham flechado para alimentar o grupo. Por esta trilha afora, cada vez mais e mais, colonos, tanto do sul como do norte, foram fechando o cerco aos índios, que cada vez, se viam mais encurralados.
pg 17

O menino “Martinho” vê sua família ser dizimada pelos Xokleng

A partir de 1850, os Xokleng intensificaram seus ataques aos colonos. O primeiro incidente grave, ocorreu, quando: Após terem tomado de assalto uma casa de colonos, nas imediações, entre as cidades de Curitibanos e Santa Cecília, não se sabe bem ao certo, sua localização). Lá, mataram o casal, levando todos seus pertences, (e um casal de crianças) e após incendiaram a casa. A menina tinha cerca de seis ou sete anos, e o menino, oito ou nove. A menina por ser mais frágil, não resistiu às mudanças bruscas de ambiente, e cerca de três meses após o seqüestro, veio a falecer. Ela teria contraído resfriado e passado o vírus a alguns dos índios. Por tal fato ,teria sido isolada pelos índios não contaminados, inclusive junto com os próprios índios contaminados e após, teria morrido junto destes, “a míngua”, (sem nada comer), recebendo dos índios, apenas água em seus últimos dias.
Tal fato foi mais tarde revelado pelo seu irmão: Martinho, que na época tudo acompanhou sem nada poder fazer. Este menino (Martinho) sobreviveu e foi criado pelos próprios sequestradores - índios, (sempre recordando, tudo o que ele havia sofrido, assim como seus pais e sua irmã). Ainda criança, fez um “propósito” (juramento), de que se ele chegasse vivo à idade adulta, iria se vingar. Quando os colonos daquela redondeza descobriram que os índios tinham matado parte daquela família e após queimado a casa, começaram a se juntar em grupos, para atacar os índios. Isto ocorreu por volta do ano de 1870. A partir daí, começa a desenfrear – se uma sangrenta e abusiva matança de índios Xokleng. Os colonos agora já unidos e organizados, formaram os primeiros “grupos de caça”, (verdadeiros esquadrões de extermínios de índios). Isto duraria por cerca de mais de três décadas. A matança destes índios brasileiros foi tanta neste período, querepercutiu em toda a população brasileira a princípio e depois, também no exterior.
pg. 18

O batizado Xokleng

Por volta de 1890, o ex - menino que fora sequestrado e criado pelos Xocleng, (em 1870), e que se chamava Martinho Marcelino de Jesus, completa vinte e nove anos e ao perceber que os grupos dos brancos estavam matando os índios, encheu – se de coragem e começou a colocar em prática a sua vingança. Esperando a ocasião certa, fez sua primeira investida, quando os índios faziam a festa de batizado de seus filhos. O batizado dos índios era realizado da seguinte forma: somente os meninos eram batizados:tinham que furar o beiço inferior onde era colocado o botoque de madeira, (daí, o apelido de índios botocudos). Quando faziam os seus batizados, os índios colhiam bastante mel, espremiam – no em cochos construídos num tronco de madeira cavado (que eu pessoalmente cheguei a conhecer mais tarde). Desta água doce, faziam como quem faz o vinhão, para destilar cachaça. Após, colocavam ervas para fermentar para ter bastante álcool ( estes índios sempre gostaram de bebida alcoólica, que em sua língua: se chamagoiozó).
Cada criança batizada tinha três ou quatro padrinhos, pois estes eram os responsáveis por embebedar a criança afilhiada. Quando esta estava bêbada, um padrinho a pegava no colo, enquanto os outros índios corriam ao redor dela, em forma de círculo bem pequeno, para que a criança ficasse completamente tonta. Quando um padrinho cansava de segurar o indiozinho, outro o - apanhava, para mante – lo, zonzo. Assim, rodavam as crianças até estas ficarem semi - mortas e depois, furavam – lhe o beiço inferior :(antes queimado com fogo para não infeccionar) efinalmente colocavam o botoque e estava então encerrado a cerimônia do batizado. Os pais e padrinhos ainda continuavam a festa, bebendo todo o resto do vinhão. Todos ficavam bêbados e depois dormiam.
pg 19

A sangrenta e abusiva vingança de “Martinho Bugreiro” tem início

Foi num destes batizados, que o rapaz branco raptado por eles, aproveitou a ocasião e fez sua primeira matança. Ali apenas começaria a sua incansável sede de vingança. Nesta primeira matança, ele só deixou viva uma menina, com idade entre dez e doze anos, que trouxe para junto do povoado em Blumenau. Ali ele se identificou, dizendo que seu nome era Martinho, na verdade Martinho Marcelino de Jesus, que logo ficaria conhecido por “Martinho Bugreiro”, por ter sido criado pelos próprios bugres e também por se tornar grande carrasco de muitos deles.Nesta ocasião, Martinho contou sua história: “de que fora criado pelos índios, e o motivo de sua vingança”.Imediatamente foi muito bem recebido pelos colonos, que prontamente o - ajudaram a formar o primeiro grupo de “”caça ao índio”, sob/ seu comando.
Meio ano mais tarde, em outra matança, já com sua equipe organizada de companheiros “caçadores de índios”, eles fizeram a primeira chacina com a colaboração de Martinho, que teria exterminado já em sua “ holocáustica - estréia”, como carrasco de Xokleng: de trezentos a quatrocentos índios. Martinho que fora criado pelos próprios bugres, conhecia muito bem seus costumes: astuto e com sede de mais vingança, achava pontos estratégicos para observar os indígenas e saber, a ocasião das festanças com a bebedeira dos batizados e no momento certo, invadir seus acampamentos para fazer covardemente, sua terrível chacina. O Morro alto, também conhecido como “Morro Peladoera um dos principais destes pontos de observação de Martinho, na região da cidade catarinense de Ascurra (hoje).
pg.20

Subscrições, em dinheiro, financiam as expedições de matanças de índios.

Como as barbáries contra os silvícolas só aumentavam, intelectuais no Rio de Janeiro, começaram a lutar em defesa dos índios. Em São Paulo havia um destes intelectuais, que dizia, que: “ se devia proteger os colonos porque estes desbravavam, trabalhavam, produziam e traziam o progresso para a nação, “enquanto que os índios só destruíam”.“Segundo o conceituado professor e historiador catarinense, José Kormann, em seu livro: “Hansa Humboldt ontem, hoje Corupá”, (em seu capítulo XIX, intitulado: Bugres), encontramos o seguinte relato – histórico: “Martinho era famoso. Trabalhou na região de Lages, foi contratado para Brusque, Blumenau e sul do estado . Seu esquadrão da morte, era composto de cerca de vinte e cinco pessoas, que lhe eram totalmente juramentadas, sob/ pena de morte sumária na floresta”.
No arquivo histórico de Blumenau, confirmamos a existência das lista de subscrições, (doações) em dinheiro, com o objetivo de financiar as expedições de matanças de índios, por Martinho Marcelino de Jesus (o Martinho Bugreiro), que se tornou um verdadeiro profissional caçador de índios. Após as grandes matanças de índios Xokleng, estes se afastaram para regiões distantes, e passaram a revidar, também com sangrentas investidas contra famílias de colonos, como ocorreu no assalto de Guaricanas, hoje município de Ascurra, quando mataram a pauladas Guiseppina Schiochet, de 36 anos, esposa do colono Francisco Schiochet e mais sua filha Emília de 11 anos, que foi estrangulada. (fato ocorrido no início do século XX, à 25/11/1902).
pg. 21

Matança de Xokleng divide intelectuais e o povo

Segundo ainda, o renomado historiador contemporâneo, José Kormann (Rio Negrinho – SC), das muitas emboscadas que realizou, Martinho trazia sempre mulheres e crianças Xokleng que entregava ao Juíz de Direito da Comarca, Dr. Ayres de Albuquerque, que as encaminhava aos cuidados da irmãs do convento Divina Providência, onde eram bem tratadas e algumas confinadas a famílias abastadas da cidade, que as – adotavam. Além destas “presas”, entregava ao magistrado não só os arcos, flechas e outros apetrechos, como também prestava contas, devolvendo o dinheiro que sobrasse, angariado nas subscrições que era repassado pelo juíz, às irmãs, para sustentar a criação das indiazinhas. Muitas dela porém, vinham a morrer precocemente, incapazes de se adaptarem ao novo sistema de vida e sem defesa diante das moléstias do homem civilizado.
A mais importante emboscada, considerando os números de bugres capturados, ocorreu na localidade de Rio das Pombas,, onde Martinho chegou com sua turma em dezembro de 1906. Trouxe consigo dez Xokleng: duas índias adultas, cinco meninas e três rapazes botocudos e nenhum índio adulto. Nesta incursão, Martinho encontra 199 locais de “pousos” e ranchos, no que se presume ter sido o grande acampamento Xokleng desta zona. Do combate, registra –se apenas, a morte de um homem branco, varado por uma flecha mortal. “É interessante observar que o “bugreiro” era escrupuloso nas suas contas, cioso de resguardar o seu nome honesto e respeitador do patrimônio alheio (branco). A perseguição, ataque, aprisionamento e morte dos bugres, parece em nada não afetar ou alterar as regras do comportamento entre os brancos. Embora não se tenha uma idéia exata, de quantos índios Martinho e seus homens exterminaram, sabe-se que foi um número extremamente numeroso deles. Mas mesmo assim, nunca foi tomada nenhuma providência de ordem legal, contra ele. Não observa – se em registros dos pesquisadores, a instauração de um só inquérito policial, ainda que suas atividades de extermínio, fossem públicas e noticiadas pelas páginas dos jornais da época. Também não eram ignoradas pelo Juíz, Dr. Ayres de Albuquerque Gama ou pelo Promotor Público, Dr. Francisco Antonio de Oliveira Margarida, ou qualquer outra das autoridades municipais ou estaduais.
pg.22

É criado o SPI/Serviço de Proteção (?) ao Índio

É evidente que as investidas de Martinho contra os índios provocaram discussões e debates, não apenas entre as pessoas do povo, mas principalmente na camada mais esclarecida da população. A polêmica movimentou a imprensa, apaixonando a opinião pública. Os moradores da cidade e os colonos do interior tomavam posições a respeito do problema e jamais registravam os debates travados. A atividade de Martinho e de seus financiadores teve o apoio do advogado e jornalista Dr. Eugênio Fouquet, diretor e redator chefe do jornal: “Der Urwalsbote/Mensageiro da Mata, de grande influência na região dos vales do Itajaí e Itapocu e assim também em Hansa Humboldt. (hoje Corupá). Em suas páginas o famoso jornalista enaltecia a atuação das autoridades em favor dos colonos frequentemente atacados e mortos, vivendo as comunidades em contínuos sobressaltos. Aconselhava a reação violenta contra os “malfeitores” visando aniquila – los. Em oposição colocou –se o Dr. Hugo Gensch, assumindo a defesa dos pobres gentios. Médico humanitário, há muitos anos clinicando em Blumenau, sua pena brilhante rebatia em termos violentos à campanha liderada pelo jornalista Fouquet. Exigia que os silvícolas fossem afugentados, mas não exterminados quando saqueassem os colonos em sua propriedades. Mas ele esquecia, contra – atacava os partidários da outra corrente, que nesses ataques, os índios furtavam alguns pertences dos colonos ferramentas, roupas, utensílios e animais domésticos. Tais ataques, já somavam então, sessenta, com vinte e oito assassinatos, sem falar dos incêndios das choupanas e outros prejuízos.
Deste estado de coisas ruins, surgiu finalmente em 1910, o SPI/Serviço de Proteção ao Índio, com sede na capital Florianópolis. Ele se limitou no entanto, a ameaçar de punição, os que aniquilassem índios. Estes, deveriam ser apenas espantados, sem que lhe fosse causado qualquer mal, recomendava a nova entidade governamental. Foram então organizadas: “turmas de atração”, com o objetivo de pacificar os Xokleng. É proposto o nome de Martinho, (pasmem), para a missão de buscar bugres no mato e traze – los vivo, como ele já havia provado ser possível, nas inúmeras investidas que efetuava. Os adeptos da catequese, como se era de esperar, repeliram a proposta, firmando que ele(Martinho), não passava de um degolador de bugres.
pg.23

Rondon nomeia o Tte. Da Rosa para tentar pacificar os Xokleng.

Em 1903, o governo federal, acostado por outras nações, nomeou Cândido Mariano da Silva Rondonpara proteger os grupos de apoio de pacificação e instalar linhas telefônicas em vários pontos do país, onde era necessário para ter comunicação com as turmas de frente.(trabalhadores que abriam as picadas e após as primeiras estradas). Rondon era filho de índios do Mato Grosso e foi educado em colégio de padresEm 1910 o governo federal criou então o Serviço de Proteção aos Índios ( SPI ). Nesta ocasião Rondon nomeou o tenente José Vieira da Rosa para chefiar a pacificação dos índios Xokleng.
O tenente José Vieira “Da Rosa”, imediatamente partiu para Santa Catarina. O destino dele: a localidade de Amônia ( hoje Ibirama), mais precisamente no distrito denominado Nova Brehmen ou Hansa, (nome abreviado da Sociedade Colonizadora Hanseática), onde estava orientado para se encontrar com o pessoal da diretoria desta firma alemã, que tinha adquirido do Estado de Santa Catarina uma área de 127.318 km2, mais 0,47 hectares, para proceder a venda de terras e a colonização da área. Área esta, situada bem no meio do território dos índios Xokleng (hoje reserva indígena de Ibirama ). Por este motivo se fazia necessária urgentemente a pacificação dos índios, que“atrapalhavam”, a colonização.
pg.24

Cia. Hansa cede a 1ª casa ao SPI

O tenente José expôs à diretoria da Colonizadora Hansa o motivo dele estar naquela localidade, que era formar grupos de apoio e pacificação. E na mesma hora formaram um grupo de apoio, que era o senhortenente José da Rosa, Dr. Raul Abott, Dr. Hugo Strauber e senhora (ele farmacêutico formado) e Dr. Maurício, que ficaram na linha de frente. A Colonizadora Hansa tinha construído uma casa grande para abrigar os colonos que vinham para comprar as terras, a uma distância já rio acima de uns 15 a 20 km. Isto era no distrito de Nova Brehmen, município de Amônia (na época), depois Dalbérgia, hoje Ibirama.Como a companhia Hansa não estava usando a casa, cedeu – a, para a comissão de pacificação se instalar. Imediatamente eles foram transferidos para o local. Ali chegando na casa grande em Dalbérgia contrataram mais alguns homens para o serviço braçal. O tenente José, que veio mais para “desbaratar” os grupos que para pacificar, instalou a turma de apoio em Nova Brehmen e logo partiu para desbaratar os grupos de extermínio, essencialmente dois grupos no vale do rio Itajaí Açu. O tenente José descendo o rio Itajaí Açu, nas alturas de Ascurra, Indaial, até Blumenau, encontrou o primeiro grupo e logo o desmantelou. O segundo, era o grupo de Martinho, mas os colonos atrapalharam o tenente José, que não conseguiu pegar Martinho que era matreiro. Ele se enfiou no mato e o tenente não o capturou, mas aos outros sim. Martinho, mesmo depois de ter desbaratado os grupos de chacina sempre ficava nas redondezas de Indaial, Rodeio, Ascurra e Apiúna, porque o seu ponto de observação na região, era um morro alto que lá existe, chamado de Morro Pelado.
pg.25

O Tte. Da Rosa desiste de tentar “pacificar” os índios.

Martinho nestas imediações observava tudo, e ficava aguardando para ver quando surgia fumaça nas serras, pois pela fumaça ele sabia se o grupo era grande ou pequeno, se tinha festa ou se era só passagem dos índios por aquelas bandas. Uma das índias que Martinho deixou em Blumenau e que foi criada e educada por uma família de alemães, foi muito útil no primeiro encontro de pacificação. Esta menina - moça deu vários dicas, sobre como se comunicar da melhor forma, com os índios. Após o tenente José desbaratar esses dois primeiros grupos, voltou a barra do rio Itajaí do Norte com Itajaí do Sul, mas não foi para o acampamento de apoio, subiu até o Itajaí do Sul e foi para o Itajaí do Oeste, subindo até os campos para encontrar novos grupos de extermínio. Lá, nos campos de Santa Catarina, desbaratou ainda vários grupos. Quando achou que tinha terminado o serviço, ele demitiu-se. Em vez de voltar para o acampamento em Dalbérgia, foi para o Rio de Janeiro.
O seu pessoal que estava em Dalbérgia, ficou preocupado porque o apoio do governo federal, já era mínimo, do governo estadual nem pensar, então, o Dr. Abott e seus companheiros também desanimaram de vez, com a saída do companheiro José. O tenente José chegando ao Rio de Janeiro se encontrou com o Marechal, Cândido Rondon, e teria desabafado nestes termos:
__ “Esse serviço não é mais para mim. O meu serviço eu já concluí. A pacificação desses índios é uma coisa muito difícil, porque eles são andarilhos, não param. Antes de mim houve várias tentativas de pacificação e ninguém conseguiu. E digo mais: esta tarefa precisa ser realizada por um homem de sangue nas veias e com muita fibra”.
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Rondon indica “ Eduardo de Lima e Silva Hoerhan” e este aceita o desafio de substituir Da Rosa
Rondon ficou muito preocupado com a conversa do tenente José Da Rosa, e após pensar por vários dias, lembra então do jovem Eduardo de Lima e Silva Hoerhan, de cuja família era amigo pessoal. O pai de Eduardo, era Miguel Hoerhan, francês, oficial da alta corte da marinha francesa, casado com Dona Carolina de Lima e Silva, (esta então, sobrinha de Luís Alves de Lima e Silva, o “o grande soldado brasileiro: Duque de Caxias”). Achou que Eduardo por ser jovem, destemido, “cheio de gás”, seria o candidato certo. Em seguida ele foi e conversou com Eduardo, e depois com o pai de Eduardo, porque Eduardo tinha ficado órfão bem criança, e pelo motivo do pai ter contraído novo casamento, a convivência dele com o pai ficou estremecida. Eduardo não gostou de uma nova família.
Quando Rondon falou com Eduardo ele respondeu: __ Amanhã eu te dou a resposta. No outro dia Eduardo levantou-se, passou pela residência de Rondon e disse:__ “ Marechal, Vou assumir a tarefa”. Eduardo após, passou na faculdade, cancelou a matrícula do curso de medicina que ele freqüentava há três anos e meio,arrumou as malas e partiu para Santa Catarina, aonde foi se encontrar com o mesmo pessoal da Colonizadora Hansa, em Ibirama. Ao chegar, foi logo recebido de braços abertos. Só lhe pediram desde início, que ele não fizesse como o tenente José, que tinha “jogado a toalha”. Eles imediatamente o encaminharam para o grupo de apoio que estava localizado em Dalbérgia. O grupo que estava ali, era o do Dr. Abott e seus companheiros, que ficaram bastante alegres com a chegada de Eduardo, e lhe – relataram estarem muito insatisfeitos, pelas faltas de apoio e constante de verbas, para prosseguir suas atividades.
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Eduardo oferece presentes aos índios para garantir um bom primeiro encontro com eles
Neste tempo, o grupo de demarcação da Colonizadora Hansa, já estava a alguns quilômetros rio acima, medindo as terras e fazendo picadas. A locomoção de Dalbérgia para frente era feita só pelo rio, com canoas. Fazia dez dias que Eduardo tinha chegado ao acampamento e ele já havia conseguido mais uns homens, para o trabalho braçal, quando numa de tarde, chegou um aviso importante da turma de demarcação de terras, (que encontrava – se a uns dez quilômetros rio acima do acampamento da pacificação, próximos a barra do rio Charla).
O recado dizia que do acampamento a cerca de 15 quilômetros acima, no sentido do lado direito para o esquerdo, os índios haviam cruzado o rio Itajaí do Norte, na localidade chamada Barra do Laís. Quando chegou a notícia que os índios tinham cruzado o rio, Eduardo, com os companheiros e duas canoas, subiram o rio, cerca de dezoito quilômetros, para chegar até o local onde os Xokleng foram vistos. Trouxeram várias caixas de presentes. Encostaram as canoas no local, colocaram as caixas nas costas e subiram a serra do lado esquerdo do rio (pela picada dos próprios índios), até chegarem no exato local, onde eles acamparam: a mais ou menos uns três quilômetros do rio, porém não encontraram nenhum índio naquele local.
Os índios Xokleng, quando descansavam paravam em qualquer lugar, não faziam ranchos, nem casinhas, e só construíam alguma coisa quando desejavam passar o inverno, ou quando ocorriam chuvas torrenciais. No local onde os índios foram avistados, havia vestígios de que eles tinham parado por ali, uns dois ou três dias antes. Eduardo e seus companheiros depositaram as caixas de presentes, no acampamento. Essas caixas continham vários tipos de brinquedos: gaitinhas de boca, canivetes, uma caixa de espelhos, bonecas e toda uma variedade de brinquedos daquela época. Deixaram tudo naquele local e voltaram para Dalbérgia.Eduardo voltou então muito entusiasmado.
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Somente Eduardo fica no grupo de atração: os companheiros o abandonam

Chegando em Dalbérgia, Eduardo disse aos companheiros, Dr. Abott e Dr. Strauber: __ No local que visitei hoje, pretendo fazer o acampamento para a pacificação. Porém, a falta de apoio por parte do governo ao grupo, só os – desanimava cada vez mais. Aproximadamente dez dias após o retorno de Eduardo, os doutores Abott e Amâncio, estavam muito frustrados e desanimados e junto com mais alguns companheiros resolveram imediatamente se demitir e realmente foram embora. Ficou apenas o doutor Hugo Strauber, asenhora Strauber e alguns trabalhadores braçais. Alguns dias mais tarde Eduardo com quatro companheiros, voltaram ao local onde os Xokleng foram vistos, para verificar o que tinha ocorrido com as caixas de presentes destinados a eles.
Chegando ao local, viram que os eles tinham levado todas as caixas de presentes, (menos os espelhos, que eles haviam quebrado todos. O pedacinho maior,ficou do tamanho de uma unha). Mesmo sem compreender o porque deste curioso ato, Eduardo ficou muito contente e voltaram todos para ao acampamento de Dalbérgia, onde foram se preparar para subir, até o local da passagem dos índios e iniciar o desmatamento para o novo acampamento. Eduardo começou então a arrumar as ferramentas necessárias, foice, machado, facão, tudo mais que era preciso e arrumou mais uns homens para serviço braçal. Então subiram ao local onde tinham deixado as caixas e começaram a abrir naquela localidade, o futuro acampamento. Hoje aquela localidade se chama Estrada do Tatu ou Serra do Tatu e está toda ocupada por colonizadores .
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A Estrada de Dalbérgia Chega finalmente a barra do rio Charla

Lá Eduardo, com os trabalhadores abriram a mata, construíram ranchos, ficaram alguns meses trabalhando e esperando pelos índios que não voltaram mais. Então Eduardo, pensando porque que eles não voltaram mais, lembrou que se eles viviam da caça, pesca e frutos. Observou ainda, que de caça ali, só havia alguns tatus, pesca apenas a uns três quilômetros, frutos nem falar. Então decidiu procurar outro local. Nesse meio tempo a estrada de Dalbérgia evoluiu e chegou até a barra do Charla. Ali na Barra do Charla a colonizadora construiu outra casa grande para a colocação dos colonos que vinham comprar os terrenos. Mais tarde a colonizadora cedeu esta casa, para o acampamento da pacificação se mudar. A medição de terras continuava rio Itajaí do Norte acima, nas duas margens. Os colonos entravam devagarinho, mas entravam.
Eduardo então fez contato com o Rio de Janeiro para que quando ele tivesse o primeiro encontro com os índios, estivesse presente uma família ou duas de índios já pacificados, que falassem o mesmo idioma. Então providenciaram para vir de Apucaraninha, (Paraná), duas famílias de silvícolas pacificados. Uma das famílias era de Guaranis: a família do índio João Gom Priprá, (João Gó) , que veio, com seus nove ou dez filhos e também outra família, de um rapaz solteiro, com o nome de Janguinha e mais uma família de índios Caingangues, com cinco pessoas. Estes falavam o mesmo idioma dos Xokleng, só que o sotaque era diferente, mas as palavras tinham os mesmos significados.
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Eduardo e equipe chegam à localidade chamada Barra do Platê

Eduardo deixou alguns homens no acampamento na serra do Tatu, com a tarefa de observar os índios, e com outros quatro homens, munidos de duas canoas, subiu o rio à procura de outro ponto para contato.Antes porem mandou fazer mais duas canoas, que era o único meio de transporte da época, e continuou fazendo investidas rio acima, procurando o melhor ponto de encontro com os índios, sempre acompanhando a equipe de medição de terras. Da barra do rio Dolmann/Barra Dolmann) à frente, ele deixou a medição de terras para trás e subiu com seis homens e três canoas. Chegando próximo da corredeira conhecida como Salto Grande, pararam e construíram ali um pequeno acampamento, às margens do rio, para depois seguir em frente e continuar a viagem rio acima, (isto em meados de 1913).
Alguns dias mais tarde, chegaram à localidade chamada Barra do Plate: um afluente que descia pelo lado direito, subindo o rio Itajaí. Ali parecia ser um local muito bom, para atingirem seu objetivo. Encostaram as canoas, subiram e começaram a inspecionar o terreno, logo viram que havia várias marcas de passagens de índios: algumas velhas, outras mais novas e algumas ainda mais velhas. Tal movimento indígena naquelas imediações era justificado devido, ser ali a pesca e a caça abundantes. Só que os índios andavam arredios e com muito medo dos brancos. Eles tinham enorme medo, daquilo que era uma terrível novidade para eles: o tiro da arma de fogo. Eduardo achou que ali o lugar seria apropriado e começou com seus homens, a desbravar a mata.
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Eduardo acha o lugar que considera ideal ao primeiro encontro e monta acampamento

É necessário e interessante relembrar as inúmeras dificuldades que existiram, para se trafegar entre o rio da Barra do Charla até a Barra do Plate, trajeto que perfazia cerca de vinte e cinco quilômetros pela água. Neste trajeto, havia quatorze fortes corredeiras, além de dois saltos d’água: o salto grande e o pequeno. Para passar o salto grande tinham que descarregar as canoas, puxar tudo nas costas para o lado de cima, subir com as canoas puxadas e após, novamente carregar as canoas e subir aproximadamente mais três quilômetros, para se chegar no salto pequeno e depois, novamente tinham que fazer o mesmo trabalho para seguir em frente. Eles enfrentavam então, ainda mais uns trezentos metros de corredeiras de águas fortes e mais uns três quilômetros, subindo o rio, para se chegar finalmente na Barra do Plate.
Ali Eduardo e seus amigos resolvem fazer o tão imaginado acampamento (futuro aldeamento indígena).Trabalharam duro, durante todo o final de 1913 e mais início de 1914 e nada dos índios aparecerem. Eduardo sabia no entanto, que eles andavam relativamente por perto e vigiavam o acampamento. Após fazerem as derrubadas e construções, a equipe de Eduardo começou a plantar para garantir a sua subsistência. (Obs: Estas roças plantadas, eram depois queimadas durante o verãozinho de maio). Ainda abriram, uma comprida abertura pela margem acima do rio Plate, para se ter melhor visibilidade, no caso dos índios aparecerem, e para não serem surpreendidos por estes.
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(15 de setembro de 1914): Os Xocleng “visitam” o acampamento no Plate

Durante a instalação do acampamento para os brancos, a medição de terras, já tinha chegado embaixo (bem próximo) do salto grande. Nesta ocasião, a Colonizadora Hansa construiu naquele local do rancho, (em salto grande), um novo e bom acampamento, no começo do mês de setembro de 1914. No dia 13 de setembro de 1914, já tinha chego ao acampamento oito homens canoeiros, com quatro canoas, além de vários outros homens de trabalho, e um casal com seu filhinho. Eduardo neste dia desceu o rio com duas canoas e vários homens. No acampamento na Barra do Plate, ficaram apenas quatro homens canoeiros, o casal com seu filhinho e mais um outro homem. No dia 15 de setembro do mesmo ano, pela manhã, no outro lado do rio Platê os índios apareceram no acampamento da Barra do Plate.
Assustados os homens e a mulher com a criança,correm para a beira do rio, pulam nas canoas e “se mandam” rio abaixo. Chegaram na Barra do Charla já altas horas da noite. No outro dia foram para Ibirama procurar Eduardo e ao encontrarem, contaram o acontecido e ele imediatamente voltou até o Charla, que dava mais ou menos 30 km de distância de onde estava, chegando no acampamento no dia 20 de setembro de 1914. Arrumou todas as canoas com os homens que tinha e no dia 21, subiram até o acampamento dos turmeiros, (que ficava embaixo do salto grande).
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Acontece o aguardado: primeiro encontro entre Eduardo e os Xokleng

Dia 22 de madrugada deixaram ali, o casal com a criança, embarcaram nas canoas com várias caixas, presentes, comidas e dois cachorros e foram até o acampamento da Barra do Plate. Quando lá chegaram, já era perto das nove horas da manhã. Encostaram as canoas no porto, e Eduardo e os outros foram subindo o barranco do rio, cautelosamente observando. Os índios como de costume, tinham colocado fogo em tudo. Mataram e comeram todos os animais existentes no local: cabritos, porcos e galinhas. Só ficou de pé um forno de assar pão, porque era feito de barro, senão também teriam queimado. Eduardo estratégica e lentamente posicionou - se, atrás do forno, sempre olhando para um lado e para outro, concentrando –se, no local onde se dava a maioria das aberturas das roças.
Contou – me ele, que aquele local, era bem aberto, e que de lá vinha uma brisa bem forte, que descia o Plate. Então levantou - se por trás do forno e ficou espiando e quando estava de pé: ouviu o som de uma flecha atirada pelos índios, que passou muito perto do pescoço dele e que fez: “tuff”. A forte brisa do vento tirou a flecha da direção certeira, salvando – lhe a vida. Então imediatamente Eduardo jogou-se no chão, apalpou-se, e viu que ela não o - havia atingido. Como já tinha aprendido algumas palavras indígenas, com a índia de Blumenau, Eduardo começou a gritar palavras de amizade, dizendo que queria ser amigo, defende - los e conviver pacificamente com eles. Aproximadamente entre dez a quinze minutos, lá do outro lado do ribeirão na costa do roçado, enfileiraram-se cerca de oitenta índios, (todos armados com arcos, flechas e lanças).
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Eduardo conhece o cacique: “Velho Trovoada” e seus filhos Vombré e Coví

Mesmo comunicando-se com aquelas poucas palavras, a comunicação já parecia Ter evoluído, entrando um pouco em entendimento. Eduardo tinha levado junto, dois cachorros que com o barulho dos índios começaram a latir. Os índios escutaram os cachorros e por sinais informaram, que queriam de presente aqueles cachorros para eles. (muito úteis na caçadas da época). Eduardo deu sinal de que os daria, se viessem buscar. Custou muito, mas dois rapazes fortes finalmente aproximaram - se de Eduardo bem devagarinho. Os dois rapazes eram filhos do cacique que se chamava o Velho Trovoada e eles chamavam- se Vombré e o Coví.
Ambos vieram juntos, cruzaram o ribeirão (que tinha uma pinguela de dois paus emparelhados) até chegarem perto de Eduardo. Então fizeram sinal de que amarrassem os cachorros para eles e saíssem. Eduardo fez sinal que não, que eles viessem pegar os cachorros da mão dele. Então vieram bem devagar e ele indo ao encontro deles. Quando eles pegaram na corda dos cachorros, de tão rápidos que eram, em apenas três ou quatro pulos que deram, já apanharam os cachorros, que saíram de arrasto, (sequer puderam andar e já estavam na outra margem do Plate). Ali Eduardo e os índios continuaram a conversar por gestos. Então Eduardo pediu, para que eles não se retirassem do local, que ele mesmo ia descer o rio, para buscar alimentos e presentes e voltaria para trazer tudo, inclusive comida, que na língua deles se chama côla. Eduardo então desceu o rio, ainda naquele resto de tarde até o acampamento dos medidores que ficava no salto grande. No outro dia, cedo, carregou as canoas de mantimentos e os - levou para os índios. Começou assim,a primeira tentativa, de uma futura e pacífica convivência com os Xokleng.
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A Colonizadora Hansa cede mais um acampamento ao SPI

Mesmo nesses poucos dias em contato com os índios Eduardo percebeu, que por mais que ele fosse inteligente e astuto, teria pela frente, muito trabalho e uma difícil convivência com eles, nestes tempos primeiros. Logo Eduardo desceu para Ibirama, onde entrou em contato imediatamente, com a diretoria do SPI (Serviço de Proteção ao Índio) no Rio de Janeiro, pedindo que mandassem com a maior urgência, aqueles casais (famílias de índios Guaranis, pra lhe ajudarem na pacificação) Dentro de uns quinze dias, esses índios chegaram em Ibirama e já foram levados para a sede do posto que era na Barra do Plate. Eduardo estava certo, com a chegada desses índios, melhorou muito o convívio entre índios Caingangue, Guarani e os Xokleng e também com a turma dos brancos da pacificação.
Por esses dias Eduardo desceu a Ibirama para conversar com o pessoal da Colonizadora Hansa, para que eles parassem ali de medir as terras, que ele ia requerer aquilo tudo para os índios, garantindo que o Estado iria indenizar a colonizadora. Deu certo, e a colonizadora imediatamente parou as medições e o acampamento que estava embaixo do salto grande, que era da colonizadora, esta cedeu para o Serviço de Proteção aos Índios, que fez uso do mesmo.
O Estado na verdade não cumpriu sua parte, nunca acertando por completo a indenização destas terras, com a Colonizadora Hansa. Ali os canoeiros toda semana continuavam descendo e subindo o rio buscando mercadorias em Dalbérgia. Quem fazia as entregas das mercadorias era a senhora do Dr. Strauber, bem como o pagamento e todo o resto da contabilidade com os empregados.
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Mais uma vez Eduardo fica sem seus companheiros na luta pela pacificação

Os canoeiros não gostavam muito da senhora do doutor Strauber, porque ela era muito enérgica, em certos pontos muito ruim. (Era o que todos unanimemente contavam). Certo dia em mais uma discussão com um canoeiro, ela estava com o revólver em cima do balcão. Segundo me contaram muitos, ela sempre estava armada, foi quando o canoeiro pediu para que ela lhe entregasse determinado litro de bebida, que estava em cima da prateleira. Quando ela se virou um pouco e levantou o braço para pegar o litro, o canoeiro deu-lhe um tiro de pistola, que a atingiu bem embaixo do braço, e ela caiu semi - morta, vindo a falecer mais tarde. Então o senhor Hugo Strauber, com a morte da esposa, ficou muito decepcionado, e se demitiu do cargo, indo embora, deixando novamente tudo por conta do senhor Eduardo.
Quando a Colonizadora se retirou daquele acampamento do posto do salto grande, esse acampamento ficou sendo o interposto para o Serviço de Proteção ao Índio. Neste meio tempo a Colonizadora construiu uma nova casa grande para abrigo dos colonos em Barra do Charla, também cedida para o posto de pacificação, que mudou-se de Dalbérgia para o Charla. A mudança, alterava a distância em mais ou menos uns quinze kms, rio acima. Porém como já tinha a estrada, ficava bem mais perto para os canoeiros realizar o transporte, (porque a estrada chegava mais perto deste interposto do salto grande). Melhorava –se assim o transporte que antes era todo feito por canoas, naquela tremenda dificuldade. E assim foram se passando os anos e tudo estava correndo bem, sem as grandes dificuldades do início.
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Eduardo têm o célebre encontro com “ Martinho Bugreiro” em Canoinhas/SC

Em meados de 1916, os índios assaltaram uma fazenda lá pelas bandas do município de Canoinhas, mataram alguns bois e os levaram embora para come - los. O proprietário mandou um recado para Eduardo, informando dos prejuízos, que os índios lhe tinham dado, e logo mandou chamar, Martinho Bugreiro, que andava sempre espreitando nas redondezas, onde ele podia matar mais alguns índios. Eduardo recebeu o recado e imediatamente saiu com três capangas e dois índios pelo picadão dos índios, guiado pelos próprios índios. Chegando na localidade de Papanduva, alugaram quatro cavalos, enquanto os índios ficaram na mata esperando, Eduardo com os três companheiros foram a cavalo até Papanduva. Lá chegando, se informou sobre a propriedade, onde os índios tinham matado os bois. Ao chegar na casa do dono dos bois, conversou calmamente com ele, e pagou –lhe o valor dos prejuízos, para evita um novo conflito entre índios e colonos. Então ele perguntou por Martinho Bugreiro e o dono dos bois disse: “Eu mandei chamá-lo, mas ele não está aqui, está lá no centro da cidadezinha de Canoinhas, na pensão tal”, porque Martinho, sempre parava em pensões com seus companheiros: bebendo uma cachacinha como era seu costume.
Chegando no local Eduardo perguntou por Martinho e disseram que ele estava ali. Mandou chamá-lo para conversar e apeou do cavalo, ficando em pé ao lado deste. Então Martinho veio de dentro do bar e como também estava com seu cavalo, imitando Eduardo, ficou ao lado do seu cavalo. Ambos estavam separados, por uma distância de cerca de oito metros, e entre eles tinha apenas os dois cavalos.
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Eduardo dá um ultimato a Martinho Bugreiro

Então Eduardo disse a Martinho:
“Eu_fui lá, onde os índios mataram os bois e já acertei tudo com o dono e continuou ainda:“Martinho, uma coisa eu vou te pedir, não mate mais índios, porque o governo já proibiu esta matança. Tu bem sabes disso. Já te escapastes da mão do tenente José. Mas se tu matares, só mais um índio e eu souber, venho a tua procura, e sabes que te encontro. Podes pensar o que vais te acontecer ? Vou te buscar nem que seja no infernoAcho que estás bem avisado !
Eduardo com os capangas pegaram então os cavalos e voltaram até a localidade de Papanduva, entregaram os cavalos, pagaram o aluguel, e foram a pé até o picadão onde estavam os dois índios – guias, que estavam esperando por eles. Andaram pelo picadão mais ou menos uns quarenta ou cinqüenta quilômetros, para chegar na localidade do Platê, onde tudo estava normal. Tinha ali mais ou menos cinqüenta “turmeiros”, construindo ranchos, casas, fazendo roças, plantando para subsistência do grupo e dando comida aos índios. Nesse meio tempo os índios que vieram de Apucaraninha foram descobrindo que esses índios vinham e voltavam, nunca paravam todos ali, ficando um dia ou dois e se mandavam, só mais ou menos um terço deles era permanente ali porque estavam construindo os ranchos para os índios e se eles não eram tantos assim, não precisava fazer tanto rancho.
Do outro lado do Plate tinham feito muitas roças e plantações, já tinham formado pastos, criação de cavalos, gado, enfim, estava como se fosse um começo de um pequeno núcleo de uma fazenda. Os turmeiros e os índios viviam numa boa convivência.
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Novo conflito coloca os Xokleng em “pé de guerra

Na semana Santa de 1917 Eduardo desceu para Ibirama para passar a festa de Páscoa, aonde ele tinha uma namorada (Francisquinha). Na sexta-feira Santa não se trabalhava porque era feriado. Então o feitor Anastácio falou para os turmeiros que tinha uns cavalos para tosar as crinas. Eles foram pegar os cavalos, potrancos e éguas para tosar as crinas, e quem tosava era um “turmeiro”. Por esta época, tinha um rapaz índio, com cerca de 17 anos, que parava mais junto com a turma dos brancos, que com sua mãe viúva. Os índios queriam que ele ficasse com eles, já que ele tinha só a mãe, e essa tinha escapado de uma chacina, não tinha mais nenhum parente da família dela. Ou seja: os índios queriam que o rapaz índio, ficasse com a mãe para dar assistência a ela. Enquanto tosavam as crinas dos cavalos o “indiote”, que foi junto com os brancos lá pro meio dos cavalos estava de cócoras olhando como se fazia aquela tarefa, de tosar as crinas. Então os Xokleng, sorrateiramente vieram e pegaram o rapaz e levaram - no para o acampamento deles.
O rapaz que não queria retornar, gritava, esperneava e se debatia, fazendo um alarido. Gritava que queria ser solto, mas os índios não deixavam ele sair. Então o feitor da época, pediu para eles que o soltassem, insistiu, mas eles não quiseram soltar o rapaz. Quando voltaram para o acampamento junto com os turmeiros, “(o feitor), pegou uma espingarda e deu um tiro para o alto. Os índios se espantaram e finalmente soltaram o rapaz. Descontente porém, os índios formaram uma praça de guerra, colocando - se em prontidão para a luta. Imediatamente o feitor mandou uma canoa para o acampamento do Charla para chamar o senhor Eduardo, pois só ele, poderia tentar pacificar mais este conflito.
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Os Xocleng propõem desafio a Eduardo

Eduardo subiu no domingo de Páscoa. Chegando lá segunda-feira de manhã, pelas nove horas, pegou os turmeiros e foram do outro lado do ribeirão, que ficava uns duzentos metros do acampamento dos turmeiros para conversar com os índios porque eles estavam muito bravos. Chegando lá começaram a conversar. Vieram diversos índios, conversaram com o senhor Eduardo e o pegaram pelo braço e o levaram para o meio deles. Então disseram que para ele, Eduardo, ser chefe deles ele tinha que agüentar tudo o que eles queriam fazer.
Eduardo mandou então que fizessem o que quisessem. Eles tiraram toda a roupa dele, deixaram - no nu como eles estavam. Eduardo tinha uma barba de mais ou menos meio centímetro de comprimento, cabelos louros ondulados soltos pelas costas, e eles com uma lança afiada rasparam a barba, cortaram o cabelo ao modo deles, e quando terminaram de cortar os cabelos rasparam também as partes genitais para que ele ficasse como eles eram, e quando acabaram de fazer tudo isto fizeram um corte com uma lança de baixo da orelha esquerda até o centro da garganta, debaixo do queixo, somente cortaram o couro. Ele tinha uma cicatriz bem visível que muita gente conheceu.
Então os turmeiros estavam ali todos armados. Perguntaram se eles deviam atirar, e Eduardo respondeu:
__ Se eu permanecer vivo não dêem um tiro. Se eu morrer, defendam-se da maneira que puderem. Isto era por volta do meio-dia a uma hora da tarde da oitava de Páscoa de 1917. Os índios pegaram Eduardo e partiram para o mato, ribeirão Platê acima. Eduardo gritou para João Gó, que era dos índios pacificados que vieram de Apucaraninha, Guarani. Gritou em português para que trouxessem os dois cachorros, armas de fogo e umas roupas e o par de botas para ele e os índios, que foram com Eduardo mato adentro.
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Eduardo convive por mais de 40 dias com os Xokleng em plena selva inóspita

Atrás foram os dois índios com os pertences de Eduardo, que eram João Gó e Janguinha, que já dito, vieram de Apucaraninha. Acamparam em cima do chapadão, nas águas do ribeirão Platê. A caça naquelas redondezas era muito abundante. Era anta, porco do mato, caitetu, veado e tudo quanto era tipo de caça. No dia seguinte, de manhã, quando acordaram, falaram com os índios e perguntaram aonde era o lugar para caçar. Dois índios foram junto com João Gó para soltar os cachorros e Eduardo com outros índios da tribo dos Xocleng e outros índios selvagens se espalharam para a espera. Dentro de poucas horas já tinham matado duas antas e um veado e João Gó tinha matado uns porcos ou queixadas. Ficaram ali acampados uns três dias. Todos os dias caçando porque tinha mais ou menos 120 a 150 pessoas para comer.
Levantaram o acampamento dali, pegaram o espigão da serra, desceram para a barra do Dênike, que fica na outra margem do rio Itajaí, cruzaram o rio Itajaí, bem na barra do Dênike, e foram ribeirão acima até chegar em cima da serra, que era um pinhalão que ficava dentro desses terrenos, que Eduardo já tinha pedido para o governo a reserva para os índios, só que o governo do estado não o reservou. Neste local tinha caça e pinhão para comer à vontade, era a época do pinhão, das vacas gordas. Ficaram acampados por mais ou menos 40 a 50 dias. Após terminado o pinhão e a caça também, Eduardo os - convidou para que voltassem com ele, para o acampamento no Platê. De onde eles estavam no pinhal, pela cordilheira da serra, descendo reto até a costa do rio Itajaí dava uns 25 quilômetros, porque do outro lado do rio Itajaí já era a Barra do Plate.
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Eduardo usa de um estratagema para conseguir se tornar “o chefe branco” dos Xokleng

Chegando na costa do rio Itajaí, defronte ao acampamento do Platê, tinha do outro lado do rio uma vaca branca, que era de propriedade do SPI. Ficaram sentados ali à margem do rio em cima do barranco, esperando as canoas que os viessem buscar. Eduardo olhou para o outro lado do rio e (talvez inspirado na história do CARAMURÚ, Diogo Álvares), viu lá uma vaca branca e perguntou para o cacique “Trovoada”, se eles índios com suas armas, dali matavam aquela vaca ? Então o cacique disse que não, e Eduardo disse que com sua arma ele a - matava. O cacique e outros índios começaram a debochar de Eduardo. Então ele perguntou para o cacique:
__ Você quer ver ? Eu vou te provar.
O cacique disse que duvidava que ele o – fizesse.Eduardo mandou João Gó cruzar o rio, e foi ao outro lado do acampamento e trouxe a arma que Eduardo tinha pedido. Era uma espingarda “winchester” com luneta. Eduardo olhou, calculou que estava há mais ou menos de 600 a 700 metros de distância, regulou a luneta e disse para o cacique que ficasse olhando, “pois quando o tiro estourar aqui: a vaca cairá lá”. E o cacique disse a Eduardo:
__ “Se você matar aquela vaca daqui, então vai ser o nosso chefe branco mesmo. Eu serei o cacique índio e tu serás o cacique branco”.
Então Eduardo disse:
__ Olhe bem. Quando o tiro estourar aqui ela cai lá. Não se espante com o tiro, só fará mal a vaca, não precisa fechar os olhos quando estourar o tiro, fique olhando para a vaca.
Eduardo então carregou a arma, engatilhou, encostou -se em uma árvore, firmou o tiro, mirou e atirou. O tiro estourou e a vaca caiu. Ali os índios fizeram uma grande festa para ele e já disseram: __ Nós te respeitamos como nosso cacique branco, só que você precisa mandar embora aquele feitor. (referindo se ao feitor que havia atirado para cima, os – assustando. (episódio relatado na pág. 40), sobre o rapaz índio que não queria voltar para sua aldeia).
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Eduardo é apelidado pelos Xokleng de “Catangára”

Eduardo prometeu e cumpriu. Chegando no outro lado do Platê, imediatamente despediu o feitor, para garantir o bom convívio com os indígenas, a partir de então. Naquele mesmo dia, os índios apelidaram Eduardo de “Catangara”, ( madeira muito resistente, oriunda da árvore da sucupira, muito comum em Santa Catarina, naquela época),e que da qual eles faziam seus arcos. Então cruzaram o rio e pegaram a vaca e com a carne fizeram uma festa “aceitação” do cacique branco.
E daquele dia em diante, passaram a respeitá-lo devidamente como tal e o diálogo entre eles, ficou mais amigável. Então Eduardo se lembrou e perguntou para o cacique “Trovoada” se ele lembrava daquelas caixas de brinquedos e presentes que foram deixadas naquele lugar onde eles descansavam, encima daquela serra, e o índio imediatamente se lembrou. Eduardo então perguntou:
__ O que fizeram com todos aqueles brinquedos?
O cacique falou que foi uma grande festa. E Eduardo perguntou:
__ Por que vocês quebraram todos aqueles espelhos?
E o cacique respondeu:
__ Claro, a gente olhava e via aquele bicho feio, então tinha que matar e para matar tinha que quebrar tudo.
Então Eduardo fez outra pergunta:
__ Quando vocês estavam no mato que matavam o homem branco, vocês comiam a carne?
O índio respondeu:
__No meu tempo de minha vida me lembro de três vezes ter matado os brancos. Eu experimentei uma vez para comer, não gostei, a carne era muito dura. Mas meu avô contava que o branco que vestia essa roupa comum como todos vestiam não era bom pra comer, a carne era muito dura, e que: “ só era boa a carne,daquele homem branco que vestia roupa preta, até encima dos pés, com aquele carreiro, de coisas luzentes” de cima até em baixo. (o índio fazia clara alusão, aos padres - missionários e suas batinas, com carreiras de botões).
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Tragédia ( ?) índios morrem ( ? ) após “churrascada” ?

Então o cacique pediu para Eduardo nomear outro feitor, e que fosse nomeado, o senhor José de Almeida,que era um operário do posto, de quem os índios gostavam. E Eduardo o – nomeou, e tudo corria muito pacificamente.
Mas ainda havia todo aquele trabalho com as canoas, rio acima e rio abaixo. Aquela luta era u infernal e parecia nunca ter fim. Neste meio tempo os fazendeiros de Santa Cecília e Curitibanos se ofereceram para fazer uma “churrascada” para os índios em Ibirama. Conversaram com o senhor Eduardo, combinaram, e mandaram os bois para Ibirama. Foram convidados todos os índios e foi feita uma grande festa, mas os índios (desconfiados dos brancos) não vieram todos. O objetivo da festança, segundo os fazendeiros, seria de confraternização, (paratornar o convívio entre índios e brancos, mais fácil). Vieram quase todos os índios pela serra do Plate, até chegarem a Ibirama. (pela cordilheira da serra, onde o trajeto se tornava bem mais perto).
Os índios chegaram em Ibirama e lá festejaram com os brancos, por quatro dias. Era uma época que o povo branco estaria muito gripado e os índios teriam pego a gripe e na volta para o posto, os índios foram morrendo, pelo picadão como formigas, porque eles não possuem anticorpos, para se defenderem da gripe, a grande maioria deles ficou pela estrada afora, mortos. Morreram mais da metade dos que foram a festa Não sobraram cento e cinqüenta índios. Por esta mortandade de índios, Eduardo ficou muito triste com este acontecimento e entre os índios, ficou uma tristeza total. Ao me contar este fato, o próprio Eduardo me confidenciou, que: “Se soubesse que aconteceria uma coisa destas, nunca ele teria aceitado esta tal de “churrascada, para os índios”, o que foi uma coisa horrível.
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A Nova vingança dos Xokleng:

Os outros índios se salvaram, porque eram arredios e não foram à festa, preferiram ficar no Platê. Pouco tempo depois, dois terços dos índios saíram e nunca mais voltaram. Destes dois terços, um terço deles, foi à localidade de Calmon, (estes eram bastante guerreiros e arredios). Ali um funcionário do SPI conseguiu aglomerá-los. Era Fioravante Esperança. Isto aconteceu por meados de 1916.
Já havia sido formado um acampamento há alguns meses em Calmon, quando nasce um novo episódio de sangue: quando de uma visita de três fazendeiros ao senhor Fioravante e ao povo do acampamento, coincide com os índios chegando de uma caçada. Quando viram os fazendeiros, (que eles conheciam muito bem,pois estes eram os mesmos que patrocinavam o grupo de exterminadores de índios), eles ficaram “fervendo” de raiva, mas não deram demonstração de nada naquele momento, simplesmente disfarçaram, se arrumando de novo para voltar a caçar, coisa que nunca faziam.
Quando estavam todos prontos, armados e com os cachorros nas cordas para sair para a “caça”, só resmungavam entre eles, pois já falavam baixinho. Num sinal em código, que se deram entre eles, avançaram contra os brancos e foram fazendo a chacina destes. Aquele que corria para tentar fugir, os índios colocavam os cachorros encima, que os – pegavam, para os índios matar. O único sobrevivente foi o cozinheiro, que quando viu aquela chacina, “meteu o pé no mato”, e mesmo tendo os índios, colocado os cachorros encima dele, para pegá-lo, não tiveram êxito. Porque os cachorros apenas corriam juntos, com o cozinheiro, pois eles conheciam bem o cozinheiro, que era quem os – tratava. O cozinheiro sobrevivente levou o recado ao escritório do SPI, instalado no local hoje chamado Clevelândia, Paraná, que não era muito distante. Quem recebeu o recado no escritório do SPI, foi o Dr. Carlos Dallabarba, (italiano, formado na Itália em advocacia), e recém chegado ao Brasil.
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O Pacificador Eduardo, confirma a Plínio, a história de “Dallabarba”

O próprio sr. Dallabarba, me confirmou este fato verídico por volta de 1955 ou 1956, quando trabalhamos juntos. Lá pela metade do ano 1918, o senhor João Gomes Pereira, conhecido dos índios, como João Serrano entrou em contato com o SPI e os - agrupou não longe do local onde houve aquela chacina (Calmon). Este lugar se chama mais precisamente, São João, (próximo à sede do município de Calmon). Voltando para minha localidade, em Barra Dolmann ,e conversando com o meu sogro, sr. Eduardo, perguntei – lhe, apenas para confirmar, se a história de Dallabarba era verdade ? E ele me confirmou que tudo realmente era verídico. Perguntei a ele por que não tinha me contado este episódio, quando me contou toda a história de sua vida com os índios Xocleng. Ele me respondeu que tinha se esquecido disto, porque não fora uma coisa que tinha acontecido com ele.
O que ocorreu, com o restante desta tribo de Calmon ? Ela, se separou em três partes: uma ficou no posto de Duque de Caxias, outra está hoje domesticada, (vivem pelas divisas de Paraná e Santa Catarina, na região de Palmas - PR, naquelas redondezas, porque esta parte dos índios já eram meio – pacificada). O outro terço, os mais arredios desta tribo, “pegaram” o costão da Serra do Mar, divisando com o planalto e foram pelas matas adentro, descendo do norte para o sul,(esta tribo, não aceitava um branco como pacificador). Assim, os índios continuaram a caminhada deles, sempre afugentados pela maioria dos brancos. De vez em quando, os brancos os - encontravam e faziam uma nova matança de índios, ou seja: continuavam liquidando com os índios, que continuavam se afastando cada vez mais, para o sul. Assim, estes índios foram vivendo nas encostas da serra geral, até chegarem ao município de Bom Jardim, onde foram vistos por último, por um grupo de caçadores em Orleans, também na costa da serra do mar catarinense.
E infelizmente, estes índios separados, acabaram se disseminando. Hoje não existe mais nenhum índio deste grupo, que saiu pela costa da Serra do Mar.
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Eduardo anuncia a seus amigos que vai se casar

Agora gostaria de dar continuidade, a história do meu sogro, Sr. Eduardo no posto Duque de Caxias. Por meados de 1919 Eduardo resolveu se casar. Então ele foi para Ibirama, para dar início nos acontecimentos. Chegando em Ibirama, encontrou toda a cúpula de seus amigos, vários deles alemães. (Eduardo tinha conquistado muitos amigos, porque tinha conseguido apaziguar os índios, que já não incomodavam mais tanto, aos brancos). Ele contou para eles que ia se casar, e os amigos não concordaram, com o anúncio de Eduardo porque eles achavam que o casamento não iria dar certo.
Os amigos se combinaram para fazer uma reunião com Eduardo e assim o - convidaram. Tinha um bar e encima se fazia um sótão, que era um grande salão para bailes. Tinha uma grande mesa e as cadeiras. Reuniu - se ali, uns doze a quinze homens com Eduardo, que não sabia do que se tratava. Sentaram todos à mesa, no interior do salão, e outros pelo lado de fora.
No sótão tinha três janelas para arejar bem a casa e uma escadaria muito grande. Então todos se sentaram e começaram a conversar com Eduardo. Perguntaram a ele:
__ Vais casar com aquela mulher? Não vês que ela não serve para ti? Ela não é da tua estirpe. Ela é de outra raça. Tu és um homem da alta corte, ela é da plebe. Não combinará contigo. Assim foram falando. A certa altura, Eduardo já tinha esgotado a paciência de escutá-los, ergueu os dois braços, e com as mãos abertas bateu na mesa e disse:__ Chega, não quero escutar mais nada.
Saltou amigo para todos os lados. Alguns pularam pelas janelas, outros desceram rolando pela escada. Dois que pularam pela janela, um destroncou o pé, o outro trincou uma perna. Aqueles que rolaram escada abaixo todos saíram feridos, (“ralados”.)
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Nascem os dois primeiros filhos de Eduardo e seu pai vêm do RJ lhe – visitar

Quando terminou o alvoroço, Eduardo desceu e foi ajudar a tratar de seus amigos feridos. Terminando esses, disse a eles: “ __ Nunca mais venham com conversa fiada. Da minha vida decido eu”. Após, partiu para o cartório, onde fez os proclames do casamento e logo que fechou a data combinada, ele casou com dona Francisca dos Anjos. (dona Chiquinha). Em seguida ao casamento, fixou residência na sede do posto no Platê. Tudo corria muito bem na “Santa Paz de Deus”, e em março de 1921 dona Chiquinha, deu à luz a primeira filha do casal, que deram o nome de Dalbérgia, apelidada de Uca. Neste meio tempo tudo acontecia às mil maravilhas. Em 14 de junho de 1923 nasceu o segundo filho, e o chamaram de Generino, apelidado de Luli. O SPI ia muito bem, mas a falta de verbas era o que mais preocupava, e ainda continuava o sacrifício, de ter que levar os mantimentos por aquelas águas e subir aquelas corredeiras penosas. Também paralelamente , continuava a colonização rio Itajaí acima, encostando no Posto “Duque de Caxias”.
Naquela época veio do Rio de Janeiro o senhor Miguel Hoerhan, pai de Eduardo, veio visitar o filho. Chegando no Platê, Eduardo mandou dois índios fazerem um passeio pelo rio de canoa, para mostrar para o pai dele como eram as dificuldades por lá. Eduardo estava na margem do rio e quando chegaram num local onde o rio era, manso porém profundo, Eduardo gritou para os índios que tombassem a canoa para jogar o velho na água. E Eduardo gritava:
__ “Virem a canoa, o meu pai é marinheiro, vamos ver se ele sabe nadar mesmo”.
Mas os índios tiveram consciência e não tombaram a canoa, para não derrubar o velho na água. Nesta ocasião, o pai de Eduardo insistiu muito, para que Eduardo abandonasse a família e fosse embora para o Rio de Janeiro, já que ele Miguel Hoerhan,com o seu prestígio, não teria dificuldade nenhuma para que Eduardo retomasse os estudos na faculdade sem problemas. E o velho Miguel lhe – dizia: “Filho deixa essa mulher, porque ela não presta, ela não serve para ti, ela vai pôr muito mal na tua vida”. Mas Eduardo não houve os conselhos do pai e continua seu trabalho de pacificação
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A Estrada chega ao Plate e nasce o terceiro filho de Eduardo e Dna. Chiquinha

Naquelas alturas Eduardo já tinha conseguido reservar todos aqueles terrenos para os índios. Pelo começo de 1923, como a estrada estava chegando perto do acampamento do Salto Grande, (onde ficava o interposto dos canoeiros), Eduardo resolveu ampliar o casario para a futura morada dele, quando ali a estrada chegasse. Com a estrada, tudo ficaria mais fácil, porque as carroças também chegariam até ali, acabando finalmente com o sacrifício do transporte por canoas.
Pelo fim de 1924, a casa já estava ampliada, a estrada já tinha chegado ali. Eduardo resolveu se mudar para a nova casa que, distava de uns oito quilômetros rio abaixo. Mudariam para morar lá: ele a esposa, os dois filhos e os empregados domésticos. Os turmeiros ficaram na sede do posto cuidando do trabalho, sendo encarregado deles, o Sr. José de Almeida. O transporte dos alimentos, finalmente deixou de ser feito por canoas, e passou a ser feito por carroças, quando a estrada chegou naquela casa. Dia 14 de junho de 1925 nasce o terceiro filho, na nova morada, que foi chamado de Setembrino, vulgo Bepe. (atualmente em 2.005, vive no município de São José/SC, e com 80 anos, é médico aposentado).Nessas alturas tudo corria muito melhor, já que acabara o sacrifício do transporte de canoas, agora substituído pelo das carroças. O que era necessário para a sede no Plate os próprios empregados vinham apanhar ali. O que era para os índios, eles também vinham ali buscar
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A Família aumenta e um triste episódio coloca “em cheque” o pacificador

Em 17 de fevereiro de 1927 nasceu o quarto filho de Eduardo e Dna. Chiquinha:, uma menina, a quem deram o nome de Generina, vulgo Nice.(futuramente, Nice viria a ser minha primeira esposa). Dois anos mais tarde nasceu outra filha do casal, a quem colocaram o nome deEsmeraldina, vulgo Nena. Dois anos depois nasceu a última filha, que chamaram de Néli. Esta faleceu com poucos anos de idade, de pneumonia. Por aquele tempo veio de São Paulo um índio Carijó, chamado pelo nome de Gregório, criado com os padres, e foi trabalhar na casa do senhor Eduardo como empregado.
Uns oito meses depois que lá estava trabalhando, ele queria voltar para São Paulo e começou a pedir dinheiro para dona Chica, dizendo queria voltar para o seminário onde fora criado, mas dona Chica só o – iludia. Sempre dizendo que o índio esperasse mais um pouco, para ela arrumar dinheiro para lhe - pagar, e assim foi levando ele na conversa. Certo dia o índio se aborreceu e agarrou a dona Chica pelos brincos, que eram grandes, e a segurou com força, machucando – a e assustando - a, então ela gritou para o senhor Eduardo, para que viesse acudi-la.
E ao perceber a situação, ele apanhou de um “rabo de tatu”,(daqueles de argola grande, de metal amarelo), e pegando pela parte da ponta, deu com a argola na cabeça do índio, e este caiu e veio depois a morrer do golpe. Ali houve um grande transtorno com a polícia. Quem se envolveu contra Eduardo foi a família Bedusqui, de Presidente Getúlio, que tentaram coloca - lo na cadeia. Mas Eduardo teve boa defesa a seu favor, até que se livrou da prisão.
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Índios comemoram a morte de “Martinho Bugreiro

Por esta época aconteceu na capela de Santa Luzia de Barra Dollman, (que era a capela vizinha do posto Duque de Caxias), as Santas Missões, feitas pelos padres redentoristas de Cachoeiras do Sul, Rio Grande do Sul. No dia do encerramento das missões, houve várias manifestações de agradecimento aos missionários, quando Eduardo também agradeceu. O cacique dos índios já não era mais o “ Velho Trovoada ”, pois ele já tinha morrido, e sim seu filho, Vombré, que também quis fazer um agradecimento. Vombré, e seu filho Aiponzinho, fizeram uma apresentação de uma disputa indígena (tipo o jogo da moura dos italianos). A apresentação durou cerca de dez a quinze minutos. Aiponzinho se perdeu, errou e perdeu a disputa. Eles ficavam colocados de cócoras na disputa. Quando terminaram todos bateram palmas e Vombré pulou ereto em pé e gritou:
__ Viva, Martinho morreu!
Então Eduardo explicou aos missionários e ao povo o porque do motivo desta manifestação indígena, era para comemorar a morte de “Martinho Bugreiro”,um dos grandes matadores de índios. Até estas alturas tudo corria bem, a Colonizadora Hansa começou a demarcar as terras rio Dolmann, acima, de 1935 a 1936. Novamente começaram a chegar novos colonos alemães, por volta de 1938, na barra do rio da Abelha. Um alemão, chamado José Tillmann, construiu uma casa para armazém e anexo construiu um salão de baile para as festas.
Numa destas festas, bailes, ocorreu um incidente com os índios. Os índios foram lá para participar da festa, mas quando chegaram foram barrados pelos colonos, que não os deixaram entrar. Um dos índios levou uma lança, e quando começou a briga, ele feriu um colono nas costas. Os colonos começaram a dar tiro, atrás dos índios. Um índio foi atingido com uma bala bem na orelha, e o outro índio levou um balaço na coxa, só no músculo. Então os índios correram, pois a desvantagem das armas deles e dos brancos, sempre foi desproporcional.
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Dna. Chica abandona a família


Naquela correria, atrás da casa de baile, tinham começado a cavar um poço, que já estava com uns 3 metros de profundidade, e naquele alvoroço um rapaz de 16 anos correu, para fugir da briga e caiu dentro do poço. Quando terminou o barulho da briga ele gritava dentro do poço e todo mundo correu para lá e para cá e não sabiam quem era, que pedia socorro, nem onde estava. Pensavam que era alguém que os índios tinham ferido. Quando melhor descobriram os gritos, viram que vinham de dentro do poço. Perguntando para o rapaz, o que ele sentiu quando caiu dentro do poço, ele disse: “ que só teve medo, de que outro viesse cair encima dele: Então, ele foi socorrido.
Em 1.939, dona Chica resolveu abandonar a família e o fez, numa manhã, do dia 6 de agosto, dia de Bom Jesus. Ela tinha um cavalo preto chamado de “Negrito”, era um cavalo lindo e bom de montaria, e ela era uma boa amazona. Mandou celar o cavalo e se preparou para sair: (quando ela saía a cavalo, usava roupa de cáqui, o mesmo cáqui, que era usado pela polícia naquela época) e botinha de coturno, como um policial usava. Aprontou-se cedo e voltou no quarto. Eduardo ainda estava na cama. Pegou o dinheiro que ela tinha e com a roupa que estava no corpo, foi no quarto de dormir e disse a Eduardo:
__ Eu vou lá na festa de Bom Jesus ver, se arranjo mais uma empregada (Eles estavam na época, somente com uma empregada). Deu um beijo de despedida em Eduardo e nunca mais voltou para casa com a família. Mas soube que ela sempre viveu em outras cidades dentro do estado. Eduardo ficou com os filhos. Dois anos mais tarde os dois filhos homens de Eduardo foram para Joinville servir o exército.. Ele então ficou com as três filhas. Lá pelo ano 1940 Eduardo arrumou uma segunda mulher em Blumenau, chamada MarlenNo final de 1941, no domingo entre natal e ano novo, ele trouxe dona Marlen para morar com ele e viveram como marido e mulher.

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Nasce o filho de Eduardo e Marlen


Em fevereiro de 1943 nasceu o filho de Eduardo e Marlen, que colocaram o nome de Edmar, apelidado de “Minho”. No dia oito de maio de 1943 casou-se a filha Generina e no mesmo ano, no mês de outubro, casou-se também Dalbérgia. Aí ficaram morando juntos, apenas Eduardo, Marlen, Edmar e Esmeraldina, além dos empregados. Pelo ano de 1938, chegou no “Posto Duque de Caxias”, um senhor que vinha da Argentina, mas era nascido na Polônia, que se chamava Menceslau Miczenski, que foi o primeiro professor do posto “Duque de Caxias”. Ele lecionou lá por vários anos. Por volta do ano 1944 ou 1945, por qual motivo não se soube, o professor acabou se suicidando enforcado. Eduardo então arranjou outro professor que era em um casal, José Balbino de Andrade e sua esposa, que já lecionavam fora do posto, num povoado. Dali em diante tudo parecia correr muito bem, até que um novo episódio causado por dois jovens ídios alccolizados, mudaria completamente o rumo da história do pacificador: Eduardo de Lima e Silva Hoerhan, culminando com sua prisão, após ordenar que atirassem num Xockleng, devido uma intriga (farsa), criada por um professor sem caráter: José Balbino, que o – traiu, jogando Eduardo contra os próprios Xockleng, (vice – versa), que ele tão duramente pacificara. O motivo da traição de Balbino, é que ele almejava estar no lugar de Eduardo, no comando do posto do SPI.
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Índios alcoolizados matam velhinho “por piedade”.


Lá pelo ano 1950 dois índios jovens, por nome de Vetiá e o outro Vôia, (de dezoito e vinte anos respectivamente, vieram para fora do posto na Barra Dolmann). No povoado foram comprar algumas coisas e tomar umas cachaças, ( goiozó). Quando tornavam do vilarejo, por volta de uma hora da manhã, (era uma noite fria e de luar). Passando em frente da casa de um senhor chamado, Joaquim Miguel Sousa, (este com a idade de 98 anos), e que sofria de friagem na bexiga, estava num fogão tipo “João – de – barro”, como se chama no interior. O velho estava se aquecendo em pé, no fogo e gemia de dores. Os dois índios olharam e viram a porta da cozinha aberta e o velho se esquentando e gemendo, e eles bêbados disseram:
__ “Ui coitado, tá sofrendo, vamos matar!
Procuraram um pau pelo chão, com aquele luar não era difícil encontrar e encontraram um pedaço de madeira bem ajeitado. Foram devagar, chegaram na porta, deram uma cacetada na cabeça, por trás, na nuca, e o velho caiu. No barulho a velhinha se assustou e correu. E os índios também correram, mas ela conseguiu ver que eram índios e o filho do casal, que morava bem perto, Luís Miguel de Sousa, ( aonde os dois índios tinham que passar correndo na frente da casa dele), escutou os gritos da velhinha que não era sua mãe , mas era madrasta e veio correndo atender. Encontrou o pai caído, que mal respirava, recolheu o velho e o - levou para a casa dele na mesma hora. O velho ficou moribundo até o outro dia às 19 horas, quando veio a falecer.
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Eduardo convence os índios a se entregarem à polícia, mas é enganado, por Balbino

Então Eduardo conversando com muito jeito com os dois índios, “ lutou ” muito para convence – los, de haviam cometido um crime, na lei dos brancos. Enfim conseguiu que eles se apresentaram na polícia e foram presos. O professor José Balbino, que sempre fora um tremendo vilão, e estava na sede dos índios onde era professor, começou a instigar os índios contra o chefe Eduardo, porque ele queria pegar o cargo de chefia. Balbino mandou bilhetinhos para Eduardo, e ele mandava a resposta. Balbino mandava novamente bilhetes, tudo na base da mentira. Ludibriou dois índios, atiçando -os para vir conversar com o senhor Eduardo.
Apenas alguns dias após, os dois jovens índiosestarem presos, José Balbino mandou outro bilhete para o senhor Eduardo dizendo: “que um índio tal e mais o índio Lili, filho de João Gó, vinham para tirar satisfações com o senhor Eduardo, por ele ter entregado os dois índios à polícia. Balbino no bilhete dizia que o intuito deles era entregar uma carta, mas não era só isso, dizia que a verdadeira intenção dos índios, seria de perto dele, para matá-lo, com uma navalhada no pescoço.. José Balbino, estava então armando, um grande golpe, contra aquele que mais o – ajudou: seu chefe o Sr. Eduardo de Lima e Silva Hoerhan. Os dois índios na verdade, queriam apenas conversar para saber ao certo como estava correndo a questão da prisão dos dois jovens índios.
Quando os índios vieram para falar com Eduardo, este infelizmente já havia acreditado na história de José Balbino, pois confiava nele. (Eu mesmo o alertei, várias vezes, do perigo de se acreditar em Balbino, já que muitos conheciam sua fama de falso e mentiroso, mas o Sr. Eduardo, meu sogro, preferiu na época, não me ouvir).
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Índio Lili é assassinado devido a intriga de Balbino

Preocupado com a falsa história de Balbino, ele preparou guarnições de pessoal branco, em todo o redor das casas, Todos estavam armados de winchester calibre 44. Tinha até autoridades presente e muita gente da redondeza. Eduardo tinha muitas armas winchester e todos foram armados, inclusive um velho sr. Expedicionário de nome Manoel da Silva (Manequinho). Quando os dois índios chegaram a emboscada estava armada. Um índio foi preso e o outro: Lili não se entregou, mas escapou, fugindo então, Eduardo não ficou sabendo o que eles realmente queriam. Quando o índio Lili fugia, Eduardo gritou:__ Prega-lhe fogo, atirem.
E todo mundo começou a atirar. O índio Lili, era muito ligeiro, e correu estrada afora, pulando de um lado a outro da estrada, fazendo um ziguezague, e ninguém conseguiu pegá-lo. A estrada subia paralela com o rio, e entre a estrada e o rio tinha uma “ nesga ” (faixa) de mata e o índio pulou pelo lado de baixo, pelo lado do rio, dentro da mata e foi subindo ,beirando rio acima. O neto de cujo velho que os índios mataram correu pela estrada acima, porque ele sabia que lá em cima descia uma picada até o rio e ele esperou ali na estrada, com uma arma pronta, uma winchester calibre 44. Quando o índio Lili chegou na picada, botou as mãos encima de uma pedra para pular na água e cruzar o rio (Salto Grande), mas não deu tempo: o neto do falecido Sr. Souza deu - lhe um tiro e este ficou ali mesmo, em cima da pedra. Então recolheram o corpo e o tiraram para a estrada e chamaram as autoridades “competentes”, para fazer a autópsia e instaurarem o inquérito. Após a liberação, o corpo do índio Lili, foi para a Barra do Plate para ser sepultado. A autópsia foifraudulenta, de modo a inocentar o autor do disparo e o médico legista que a realizou, no final foi inquirido junto no processo e respondeu ao tribunal do júri. Nesta época já tinha mudado o nome de SPI/ Serviço de Proteção aos Índios para FUNAI/Fundação Nacional do Índio. Imediatamente a FUNAI providenciou um novo chefe. Ironicamente, José Balbino, o traidor, que tanto traiu, para conseguir o cargo de Eduardo, não conseguiu seu intento, foi transferido após, para o município de Xanxerê.